O que, que vocês qué?

Por Toni C. *

Uma salva de palmas!
Ainda ecoa no club 28 de Setembro nossa maneira singela, mas verdadeira e intensa de homenagear o parceiro Dexter. O 20 de abril marca um ano exato que cantaram a liberdade do 8º Anjo e agora ele pode compartilhar momentos como este em Jundiaí, durante o lançamento do nosso livro. A atividade apresentada pelo locutor do Espaço RAP Nuno Mendes, participou centenas de pessoas, alguns vindos de longe, gente como o MC Segredo que narrou uma situação recente.

O rotor do helicóptero começava a girar, quando chegou a ordem do comando, solicitando que o piloto e o co-piloto da aeronave de patrulha, buscassem duas pessoas no palácio dos Bandeirantes para leva-los até à prefeitura.
No céu, o prefeito da cidade fala com o secretário de segurança:
– Como é linda a cidade daqui de cima!
– É porque ele não anda lá em baixo – comentam os pilotos entre eles.
– Hei! Não são vocês quem nos buscam todos os dias para nós levar para almoçar. Vocês são novos no agrupamento?
– Estamos substituindo os oficiais que estão de folga senhor.
Informou o piloto desejando encerrar logo o assunto com aquela gente.
– E vocês fazem alguma coisa nas horas vagas? – Perderam a chance de ficarem calados – Os outros pilotos, um faz parte de uma dupla sertaneja e o outro cursa medicina.
O piloto negou ter outra função, enquanto o co-piloto informou que estuda Direito e canta RAP.
Um susto. Foi a reação do secretário. Que perguntou incrédulo o que ele havia dito.
– Estudo direito senhor.
– Sim e também canta o que?
– Eu sou do Hip-Hop, faço parte de um grupo de RAP.
– Que interessante! – o prefeito mais tarimbado deu corda querendo, quanto tempo cantava, o nome do grupo…
– Esse não é um grupo que canta uma música que fala mal da polícia?
Perguntou o secretário sem entender.
– Denúncia a conduta de maus policiais, senhor.
O prefeito fez mais uma investida.
– É uma música interessante. Eu ouço as vezes. Infelizmente houve aquele episódio na Praça da Sé. É uma pena que há grupos que mancham a imagem do Hip-Hop.
– Da mesma forma que tem na polícia e na política maus elementos. – Rebateu o Sargento.
Ficou chato, o clima estava pesado e procurando o que dizer o secretário se saiu assim.
– Você viu o que estão falando? Sobre o fim do Hip-Hop? Meu filho mesmo está lendo um livro que se chama: “Hip-Hop Morto!”
– O nome do livro é “O Hip-Hop Está Morto!” secretário. Não se deixe levar pela aparência, como diz a letra de um grupo chamado Sistema Negro: “Apenas quem ler o livro por inteiro entenderá o título.”
O prefeito queria saber mais.
– Minha secretária lá na prefeitura comentou desse livro, disse que está lendo e achando muito interessante.
– Eu sou parceiro do autor do livro e tenho acompanhado ele nos lançamentos.
– Pera aí. Você é o Segredo?
– Sou eu mesmo senhor.
– Você tá famoso, na corporação só se fala em você.
Eles realmente já ouviram falar no sargento e eles conhecem sobre o Hip-Hop mais que muitos manos na quebrada. O que eles não sabiam é que naquela noite eu, o MC Segredo e o graffiteiro Bonga iríamos participar da vigésima atividade de lançamento do livro numa cidade no interior de São Paulo. A placa dá boas vindas: “Bem vindo a Santana do Parnaíba. O berço dos bandeirantes”, vai vendo.
Não havia um tapete vermelho na recepção da entidade que promovia o lançamento, era muito melhor. Na calçada tinha um tapete de livros no chão, para serem emprestado para qualquer passante. LiteraRUA é essa fita aí! Dentro da instituição uma estante alta e larga abrigava muitos livros antigos e raros.
Ódio, é o sentimento que tenho ao olhar aquela parede de livros e notar quanta coisa nos é escondida, quanto tesouro negado. Ainda bem que instituições como aquela e algumas pessoas fazem o tráfico de informação e revelam um pouco de tudo que ainda ignoramos.
Como o Daniel, professor da rede pública pediu em sala de aula para que os alunos lessem e resumissem o livro. Alguns alunos entregaram o resumo na semana seguinte. Mesmo com o prazo só para o final do segundo bimestre.
No tráfico internacional de informação está a brasileira Jaqueline Santos. Hoje bolsista em Havard, graças ao Hip-Hop foi de Sorocaba para Cambridge estudar. Se dedica ao Hip-Hop Archive na terra do Hip-Hop. E o livro “O Hip-Hop Está Morto!” já integra não apenas o acervo da maior universidade do planeta. Mas também o acervo da universidade de Princeton e também o da Brown University.

Os cães ladram, mas a caravana não para
Numa dessas atividades que o livro me levou, um parceiro discorda da preparação para receber grandes eventos internacionais no Brasil.
Segundo ele, meio alcoolizado, agente não tem que querer falar inglês para atender os gringos. Assim, quando eles entrarem no país agente tem que perguntar para eles:
– O que, que seis qué?
Taí, uma pergunta propícia para se fazer ao secretário de segurança e ao prefeito de nossa cidade:
– O que, que vocês qué?
Dias depois o secretário, propos ao sargento trazer seus amigos do Hip-Hop para conhecerem as dependências da polícia militar do estado de São Paulo.
– Nossos homens precisam conhecer melhor os seus homens. Precisamos aprender a abordar corretamente os cidadãos e o Hip-Hop talvez nos ensine isso.
Hoje esse Sargento comanda 500 homens na Escola de Soldados.
E o mais fantástico, é que toda essa história, não é ficção.

* Artista multimídia, autor do romance “O Hip-Hop Está Morto!” e do documentário É Tudo Nosso!, organizador do Hip-Hop a Lápis. Membro da Nação Hip-Hop Brasil e editor audiovisual da TV Vermelho.

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